quarta-feira, 2 de março de 2011

Exílio em Veneza - Parte 2

A vida eterna é superestimada. Os mortais vão às igrejas em busca da vida eterna no que eles chamam de paraíso. Se ao menos soubessem o quão tediosa pode ser ter a eternidade pela frente! Nós, imortais, temos apenas uma modesta escolha entre o tédio e a insanidade. Que outra possibilidade haveria? Nada do que satisfaz a humanidade pode me satisfazer, exceto talvez, pela música. Não a música tediosa da liturgia católica a qual sempre detestei, mas sim, o fantástico mundo musical que me foi apresentado por Niccolò! Niccolò merece a eternidade pelo simples fato de tornar a minha eternidade menos tortuosa.

Não tenho grande habilidade com isto, afinal, fui criada na cristandade, o que significa basicamente muito sofrimento, nada de diversão e um tédio infinito. Até mesmo a idéia cristã de paraíso me soa como danação eterna. Uma vez que sou amaldiçoada por Deus, não terei que me preocupar com isto. Aliás, antes mesmo já estava condenada: sempre fui uma péssima cristã. Nada pessoal, mas ninguém me perguntou se era isso que eu queria e agora que estou livre deles, posso parar de fingir. Paradoxalmente, odeio a Igreja Romana, mas amo seus templos. É como se me lembrassem de minha insignificância e ao mesmo tempo me fizessem sentir segura. Obviamente, uma falsa segurança, mas eu não me importo, nada tenho a perder.

Niccolò me deu um violino. Achei repentino, pois nos conhecemos há pouco tempo e este violino em especial parecia significar muito para ele. Ele quer que eu o veja à luz do dia para lições de violino e passeios pela cidade. Ele ainda desconhece minha verdadeira natureza, acha que sou apenas uma jovem inofensiva. Quisera eu, poder fazê-lo enxergar através dos meus olhos, ver o que vejo. Mas ele é excessivamente frágil para isso e não tenho ainda a coragem necessária para mostrar-me tal como sou. Ele é ainda tão jovem que tenho medo de contagiá-lo com a minha fria e monocromática realidade.

Ele diz que quer me fazer conhecer a vida. Estaria mais interessada se ele tivesse algo a dizer da morte! Ironias à parte, tenho necessidade de distrações e ele e seu violino foram como um presente à minha não-vida. Além de lições de violino, tenho lido todos os livros que encontro. É incrível a quantidade de livros disponíveis agora. Quero aprender tudo o que for possível sobre esta época! Finalmente a humanidade tem algo a me ensinar! A superstição dá lugar ao verdadeiro conhecimento e a religião cada vez mais perde espaço. Finalmente acordei em uma época em que vale a pena viver!

7 comentários:

L. Fiscina disse...

Bem vinda ao meu blog. Foi um prazer ter conhecido o seu. Instigante, sagaz.., são as palavras que por ora me vem a cabeça.., ainda não tive tempo de ler, mas irei, especialmente os textos de Veneza, seu relato me lembrou o meu próprio relaro que fiz de minha viagem a Índia, está no blog. Enfim, psicóloga nas horas vagas, isso é bom. seria loucura se fosse ao contrário.
gde abraço,
Luciano Fiscina

Dra. Kelly Ohana disse...

Olá amiga, você tem que se tratar. Eu li as coisas que você escreve e achei doentio. Esse seu blog é pura fezes intelectuais. O nosso mundo moderno não tem espaço para essas inutilidades que você escreve.

L. Fiscina disse...

Que agressivo Kelly! para vc ter lido, é pq os textos te capturaram! se o critério fosse o fúnebre, o que faríamos com Jack Kerouack e Dostoieviski? Em todo o tempo sempre haverá espaço para os pensamentos da alma e para a desilusão do mundo. reveja sua posição e se manifeste de outras formas, isso que vc fez não é crítica literária, é ofensa, não compactuo. reveja-se por completo e devolva a palavra fezes, mal colocada, de volta no lugar de onde ela saiu, pq. não é no texto em ue ela está, mas na boca de quem falou.

Nih disse...

Olá Fiscina, muito obrigado pelo comentários, aliás.

Acredito que a Kelly pode não estar muito familiarizada com a ficção. Veja bem, o propósito da ficção é ter a liberdade de fantasiar.

Eu por exemplo, seria incapaz de escrever como alguém da época retratada e se fosse, jamais seria compreendida por qualquer leitor, mas no entanto eu me autorizei a escrever uma história. Fantasiosa, com certeza.

E sem a menor pretensão de ser como a realidade. E visto que não sou escritora profissional, por que deveria ser cobrada como tal. É só mais uma história, que talvez interesse a jogadores de RPG e alguns outros que se conectem com a narrativa.

Mas eu acho que, até mesmo em virtude do post específico que você atacou, não se trata de uma crítica literária (até mesmo porque não seria digna de tal coisa), mas sim de uma crítica religiosa.

Você provavelmente é religiosa e ficou ofendida com os "maus modos" da personagem e certamente desconsiderou que é ficção. Provocar raiva, choro, alegria, indignação é própria da literatura mas é preciso, no entanto, separar a realidade e ficção para não acabar sendo uma dessas pessoas que faz juízos de valor baseados em "acontecimentos" e "atitudes" que jamais existiram de fato.

Se eu sou uma reles humana e posso escrever uma história sobre seres imortais, eu também posso ser capaz de construir personagens completamente diferentes de mim.

Edgar Allan Poe, por exemplo, escreveu diversas histórias com personagens completamente insanos e isso não significa que ele fosse insano, mas sim que ele era capaz de se conectar com a loucura, ainda que, de uma loucura mórbida.

Minha personagem é um ser que viveu por séculos, foi fruto de uma violência, teve uma vida que não desejou e possui o fardo de estar sozinha no mundo e não morrer. Ela gosta de coisas mórbidas, raramente sorri, é indiferente a muitas coisas, perdeu boa parte de sua humanidade há tempo. O mundo que ela enxerga é cinza. Esse é o mundo dela, é a maneira de ser nesta realidade alternativa em que escrevo. Não vejo como isso poderia ofender alguém, sinceramente. Talvez não seja eu a pessoa que precisa se tratar.

Pois então Fiscina, muito obrigada pelos elogios, aliás. Muito bom saber que ao menos a alguém agrado, apesar de jamais ter sido essa a minha intenção. Claro que quem escreve em um blog, escreve para ser lido, mas não apenas para isso, mas também um pouco de catarse e satisfação pessoal. Entro no seu blog de vez em quando por causa da psicologia e o fato de você escrever sobre temas que se aproximam um pouco do que venho estudando desde a graduação e gostei bastante do que encontrei. Continuarei aparecendo e você seja bem-vindo, lógico!

Nih disse...

Correções:

"Provocar raiva, choro, alegria, indignação é próprio da literatura"

"se conectar com a loucura, ainda que, com uma loucura mórbida."

Nih disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Nih disse...
Este comentário foi removido pelo autor.